quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A PARTIDA


O teu braço dentro de mim, era como se o dia nascesse ao contrario. Se eu pudesse abrir a mão e largar todas as dores de uma só vez. Se eu pudesse abrir a mão dentro de você acho que iria arrebentar. Aquele mundo quente envolvendo as texturas que toco. O sonho de experimentar aquilo todos os dias. Era o que não podia ter vivido espalhado na minha cama, de pernas abertas. Eu não queria abrir mão, não não iria abrir a mão. Os olhos vagos pintados na sua cara não me dariam essa permissão, de parar de beber, de parar de sofrer, de parar de lastimar por uma vida de merda, de parar de implorar por uma migalha da ínfima atenção que nunca existiu, os teus olhos manchados no meu espelho, esse monstro transformado em imagem , a beleza de ser mais que você, em todos os lugares, sua assombração, sua perseguição tenaz de meu corpo, de minha carne, dos meus homens proibidos, de querer se deitar com teus filhos, proibidos, todos eles, diziam não, não iremos nos maquiar, não iremos nos travestir, não iremos nos deitar com os nossos pais, não iremos ir para a cama com eles, não, nós não iremos ser estuprados por eles nunca mais, somente nas noite de lua cheia, somente de batom, somente quando as crianças quiserem participar das mascaradas, somente quando os padres quiserem comer as meninas também, somente quando os adultos de rabo comprido colocarem suas línguas nas sarjetas, e esfregarem seus prepúcios nos escândalos das prostitutas de um milhão de rubis, sim, somente quando os filhos forem os pais que eles entenderão, e somente quando arrancar os olhos da cara que poderei ser livre outra vez, que poderei amar, somente quando não tiver mais pele no corpo, não estarei mais sujo de vida imunda pelo parricídio celerado dos pesadelos cotidianos, do meu egoísmo mais ateu, do meu monstro mais meu, esse desfigurado ser que mora em mim, o homem sem face, que não sabe mais para onde olhar, que perdeu os dados, as esmeraldas que a vida tinha lhe dado, quando tropeçou no bueiro do seu próprio subterrâneo rio...O teu braço dentro de mim, um oceano, e teus olhos, fora, em tudo que não sou eu...

FC

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