sábado, 28 de setembro de 2013

O PAI


Hoje eu acordei e atirei uma travesseiro no meu gato
Ele não parava de miar, aqueles miados insuportáveis
As seis horas da manhã
Meu pai atirava travesseiros em mim,
Quando as seis horas da manhã eu queria entrar no quarto
Odeio saber o quanto somos iguais
Acho que por isso não vou ter filhos,
Iria passar uma vida atirando as coisas nele para que ele não fosse igual a mim
E no final , ia acabar tendo o mais egoísta dos gatos miando aos meus pés, o mais homoeróticos dos bichos me arranhando todas as noites, o mais controverso animal gritando sua irrevogabilidade todas as manhãs, para que pare de ser como eu, para que eu pare de ter que suportar de ter um espelho de defeitos rasgando a minha carne todos instantes da minha vida, sendo que nas partes que me agradaria, ele acabaria sendo um cachorro, e eu, nesse ponto, ia abusar de sua natureza, do seu cachorrinho, e ia montar nele feito um menininho desprotegido, ia abusar dele, ia usar ele para os meus prazeres, para me satisfazer da maneira mais sórdida possível, para ser sádico e cruel com esse filho, para ver ele definhar em si mesmo, para ver ele não ser o que ele é, todos os dias da sua vida, ele não sendo, o gato, e somente o meu cachorro, latindo para mim, latindo, sim, latindo, no meu quarto, na minha cama, com o rabinho empinado, o meu cachorrinho... vem, late pra mim filhinho, eu ia dizer, late mais alto, late, late agora, late porra, late meu filho, agora late, late que eu quero ouvir, e agora abre isso  , abre isso bem que eu quero que você sinta a minha mão ate você berrar de tanta dor, isso, abre mais, vai, abre porra, não é macho? vai, berra, todos os dias, para o resto da vida, vai ser assim, aaaaaaaaaaaa, hahahahaha.....
Hoje eu acordei com meu pai na minha cama
Amanha completo alguns anos que ele dorme comigo
Acho que os pais não deveriam dormir com seus filhos assim
Não dessa forma, deveriam deixar seus filhos dormir com outros homens também
Eles são muito egoístas, querem seus filhos só pra eles
Acho que não deveriam começar deitar com seus filhos quando eles são crianças
São muito novos para entender o que é ir para cama com o pai
De qualquer forma, cansei de dormir com ele, amanha vou deixar a cama vazia
Quero abrir espaço para um novo homem dormir ao meu lado

 FC

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O AMOR


Foi mais um anjo que também passou, eu queimei as suas asas. Não pude amar, não posso encostar numa pele de verdade com seus olhos deitados em mim. Sentir de verdade. Essas algemas sempre estiveram nas minhas mãos, e não pude te encostar quando veio, não pude sair do meu narcísico espelho amaldiçoado das imprecações desses desamparos todos.  Você sempre esteve entre Eu e o mundo , mesmo sem pedir, eu fui sendo o assassino dos meus homens todos, o assassino dos meus amores todos, um por um, ia os devorando para você, mastigando seus pedaços, lentamente, devagar, eu ia os entregando numa bandeja vagabunda, até avisava a hora , ou quando você não estava em casa, eu deixava na portaria, embrulhado num plástico, ou num jornal velho onde guardam aquelas carnes de açougue, eu deixava eles lá, para você ver como eu fazia bem feito, para você apreciar a minha obra, para você incentivar a minha arte, o que em silêncio eu sabia que tinha que fazer, o serviço sujo e bem feito, o destroçamento desses homens inocentes , coitados, todos eles estraçalhados, um por um, tirava a carne, a pele, os olhos, a boca, os órgãos mais puros, todos, eu os ia canibalizando vorazmente, no começo eles nem percebiam que iam sendo devorados, que estavam caminhando para a morte, sem volta, sem retorno, sem direito de respirar sequer uma única vez, aqueles lindos olhos deitados ao meu lado, para nunca mais viverem outra vez, sim, eles tinham que ser destruídos, os meus dedos eram as pinças, minha língua os teus alicates, e teus tentáculos os meus brinquedos de fantasias ilimitadas, eu morrendo em todas elas, a cada dia,  o ser carnívoro animal que me transformei, o cheiro de cadáveres que colecionei a minha volta todos os anos, uma pilha deles todos, para lhe dar de presente, a cada aniversario, a cada ano que passava, eu cruzava os mares, o continente para lhe levar uma lista de mortos, de almas que nunca mais voltariam, todos aqueles amores mortos que passaram por mim, que nunca nasceriam, nunca... a cada esvaziamento eu cumpria sua sentença, e escrevia minha sina como quis, para solidão de todos os meus dias futuros, para você no seu túmulo dos infernos da posteridade poder se orgulhar, para eu poder também me orgulhar amanhã no cemitério quando for lhe visitar e nas costas carregar essa pilha de mortos, e juntos tivermos todos esses motivos de corpos para comemorar a nossa solidária solidão , eu na minha cova petrificada no quarto, e você, repousando na terra debaixo dos meus sonhos.


FC

O ESTUPRO


O prazer metálico de ser fálico que não fala nunca. Nunca me olha nos olhos, e não fala das dores dos meus séculos acumulados na alma. Por que não me olhas? A cela ao meu redor impede o toque dos vivos, estou morto para a humanidade  inteira e sua frieza insiste em querer afirmar a não existência do meu ser. Esta é tua tática diabólica, da não confirmação da minha existência, atravessando minha carne com o sepulcro dos teus olhos, com a lança das tuas tristezas todas e dos teus medos, e assim pensas que vai vencendo a ti mesmo, me matando todos os instantes, todas  as horas que pode, não olhando para aquilo que criaste, não vendo as tuas entranhas se debatendo no mundo, não enxergando a tua vida se debruçando na existência. Não , ser covarde das carruagens metálicas, me tira as pernas e me corta os braços, me cega os olhos e me amputa os dedos, me decepa o tesão de amar um homem de verdade e escreverei com meu sangue, e dançarei de joelhos, e farei da minha arte o meu caralho, para ainda assim te receber sorrindo o dia que na primeira fila teus olhos apreciarem os meus.

FC

O ADVOGADO


O orgasmo, escorrendo pela parede,
Eram todo os meninos crescidos, éramos homens enlouquecidos, com os pelos eriçados, os dentes amarelados, os vasos entupidos,
O cheiro velado nos olhos escuros, eu estava preso e amarrado, eu estava preso e amarrado nos gritos impotentes desse prazer, desses homens do escuro, que me encostavam sem eu sentir, não podia sentir nada, não podia, estava algemado, estava preso nas sua maldições, nos seus olhos das sentenças de um santo magistrado, dos advogados puros que nunca sentem orgasmo, e todos eles berravam no tribunal, e se esfregavam no púlpito de carvalho legal, onde rezavam as tuas leis, onde tuas sobrancelhas me inquiriam, na sisuda inquisição dos tempos sem curva entre as entrelinhas que habitam um pensamento e outro...curvado estava para as santas penetrações, para as tábuas duras, eu estava para as tábuas duras pregado e pendurado como um estagiário nos penais corredores , a duras penas, como cristo antiquado de ponta cabeça, nos falatórios dos monastérios surdos dos telejornais repetitivos,  os papeis que limpavam os ânus sujos onde coloco minha língua, onde enfio os meus dedos, as paredes das carnes onde deposito os restos das minhas unhas mal aparadas, quando o machucava sem saber, arranhando suas entranhas sem querer, não podia arranhar, não podia colocar as mãos no interior sagrado sem estar com os dedos limpos, com as garras bem feitas, com o cheiro de respeito no tato, não, e eles não ligavam, aqueles senhores todos, que vinham com as perucas e se roçavam na minha perna, e raspavam com a lixa de suas línguas os restos de vida dos meus tecidos, das sedas encardidas, dos veludos machucados, dos algodões amargos, dos cetins sofridos, os tecidos dos meus pedaços espalhados pelos cantos estreitos dos espetáculos constitucionais da sodomia mortuária, era ridículo, me sentir  o menor dos seres do mundo naquele escarcéu de palhaços suicidas, e não poder me matar com as mesmas intensidades, não poder viver toda aquela vida fenomenal que existia na morte de cada fascínio de um orgasmo absoluto transcendental, não, aquilo tinha que ser muito mais livre do que era, e na vista de todos os olhos, aquele tremer por todo o corpo, aquele iniciar tinha que ser profundo e sem traumas, porém tuas sobrancelhas castradoras sempre apareciam no meio da madrugada, no intervalo dos mergulhos para interromper com as cataratas das entranhas libertárias da vida em pulsação supra-terrena... Não, não tinha a toga para me limpar, não, não tinha sequer o direito de usa-la... advogado? De que? De merda? Que direito tenho em mim? Direito de ser eu e nada mais, direito de ser, e ponto, isso me basta. É o único direto que nos cabe.  O direito do livre orgasmo do ser, fora do quadro pendurado nas paredes, fora das molduras. Fora dos brasões e dos engessamentos diplomáticos. Fora. O direito do orgasmo pluricelular. Todos os líquidos seminais... dentro de mim e do meu direito de ser em mim contínuo e absoluto. Sim, tudo isso e nada mais.

FC 

A PARTIDA


O teu braço dentro de mim, era como se o dia nascesse ao contrario. Se eu pudesse abrir a mão e largar todas as dores de uma só vez. Se eu pudesse abrir a mão dentro de você acho que iria arrebentar. Aquele mundo quente envolvendo as texturas que toco. O sonho de experimentar aquilo todos os dias. Era o que não podia ter vivido espalhado na minha cama, de pernas abertas. Eu não queria abrir mão, não não iria abrir a mão. Os olhos vagos pintados na sua cara não me dariam essa permissão, de parar de beber, de parar de sofrer, de parar de lastimar por uma vida de merda, de parar de implorar por uma migalha da ínfima atenção que nunca existiu, os teus olhos manchados no meu espelho, esse monstro transformado em imagem , a beleza de ser mais que você, em todos os lugares, sua assombração, sua perseguição tenaz de meu corpo, de minha carne, dos meus homens proibidos, de querer se deitar com teus filhos, proibidos, todos eles, diziam não, não iremos nos maquiar, não iremos nos travestir, não iremos nos deitar com os nossos pais, não iremos ir para a cama com eles, não, nós não iremos ser estuprados por eles nunca mais, somente nas noite de lua cheia, somente de batom, somente quando as crianças quiserem participar das mascaradas, somente quando os padres quiserem comer as meninas também, somente quando os adultos de rabo comprido colocarem suas línguas nas sarjetas, e esfregarem seus prepúcios nos escândalos das prostitutas de um milhão de rubis, sim, somente quando os filhos forem os pais que eles entenderão, e somente quando arrancar os olhos da cara que poderei ser livre outra vez, que poderei amar, somente quando não tiver mais pele no corpo, não estarei mais sujo de vida imunda pelo parricídio celerado dos pesadelos cotidianos, do meu egoísmo mais ateu, do meu monstro mais meu, esse desfigurado ser que mora em mim, o homem sem face, que não sabe mais para onde olhar, que perdeu os dados, as esmeraldas que a vida tinha lhe dado, quando tropeçou no bueiro do seu próprio subterrâneo rio...O teu braço dentro de mim, um oceano, e teus olhos, fora, em tudo que não sou eu...

FC